sexta-feira, 22 de abril de 2011

10 Filmes - Para Mulheres Sobre Mulheres - Nota 10 - Continuação

9 - Minha Vida Sem Mim - 2003.

É a história de uma garota de 23 anos que descobre que tem um tumor avançado pelo corpo e que sobreviverá apenas dois meses. Ela é casada, cria duas filhinhas e leva uma vida modesta. Diante do diagnóstico, resolve não contar a ninguém que vai morrer. Dedica as oito semanas que lhe restam para acertar algumas dívidas com ela mesma e, principalmente, preparar o terreno para que as pessoas que ela ama sejam felizes durante sua ausência.

É daqueles filmes de assistir na companhia de três caixas de lenço de papel, mas não há pieguice.

O filme mostra a personagem gastando seus últimos dias com pequenos prazeres, como pisar na grama de pés descalços e dançar ao ar livre. Até aí, nada de muito original. O que comove é a sutileza da diretora Isabel Coixet, que soube traduzir o senso de proteção que há em toda mulher, o tal lado maternal que se manifesta em todas, mesmo entre as que não tiveram filhos - é da nossa natureza cuidar de maridos, pais e irmãos também.

A personagem não é controladora, apenas generosa. Diante da iminência da morte, não lhe agrada a idéia de que todos sofrerão com seu desaparecimento. Então tenta, com doçura, transformar futuras dores em alegrias.

Como se faz isso? Não requer nenhum gesto espantoso, apenas atitudes delicadamente humanas.

10 - Jogo De Cena - 2007.

O documentário de Eduardo Coutinho merece ser visto porque é um show de humanidade.

Na tela, mulheres anônimas contam seus dramas particulares como se estivessem numa sessão de psicanálise: relações complicadas com filhos, separações conjugais, sonhos adiados, o enfrentamento da morte. Mas cada uma dessas histórias torna-se única pelo close, pela atenção que somos convidadas a dar a cada uma dessas desconhecidas.

O pulo do gato da obra é que esses depoimentos são intercalados pela aparição de atrizes famosas que interpretam essas mulheres anônimas, repetindo o mesmo texto. Marília Pêra, Fernanda Torres e Andréa Beltrão aceitaram o desafio, e aí vem o instigante do filme: não chegaram lá, apesar de toda a tarimba que possuem. Os depoimentos verdadeiros dão um baile.

Essas atrizes costumam dar vida a personagens fictícios em novelas e peças de teatro com total competência, mas, quando eles existem mesmo são confrontados com a interpretação que recebem, a interpretação é desmascarada como tal. É incrível ver a reação das atrizes diante do resultado. Elas ficam desestabilizadas por não conseguir dramatizar com naturalidade aquilo que é vida real. E é nessa desestabilização que as atrizes também mostram sua faceta mais humana - e acabam por participar do documentário com depoimentos delas mesmas. Aí funciona.

Por fim, mas não menos importante, todas as mulheres que aparecem no filme, por mais que tenham vida sofrida - e como têm! -, não perdem sua graça.

No auge dos depoimentos dilacerantes, surge uma ou outra frase que faz a plateia gargalhar, porque todas buscam algo que atenua o drama, alivia a pressão, relativiza o que está sendo contado. Não importa que elas não sejam grandes intelectuais: são inteligentes em sua postura de vida, sabem que até do sofrimento é possível arrancar um sorriso.

No final das contas, fica claro que a tal alegria brasileira é mesmo redentora.

Martha Medeiros
Jornalista, escritora e colunista
do jornal Zero Hora de Porto Alegre, e de
O Globo, do Rio de Janeiro.


Publicado na revista Claudia
Edição Setembro/2009.

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