Para os que acompanham as crônicas domingueiras de Onélia Queiroga, não significará surpresa o lançamento de mais um livro de sua autoria. Surpreso fiquei, não com a qualidade do material encontrado, mas com o convite para apresentá-lo. Militando ambos na área acadênico-jurídica, temos o gosto comum pela crônica, pelo relato do cotidiano. Só que, nessa área, Onélia Setúbal Rocha de Queiroga o faz com rara maestria. E não me sinto ainda qualificado para tal apreciação.
"Histórias Orbícolas" demonstra a sagacidade de quem conhece o mundo, o país, as pessoas. São relatos ora sérios, ora com toques de humor, sem esquecer, vez por outra, de um toque jurídico. Ler as crônicas de Onélia é como se estivéssemos ao vivo no local dos acontecimentos. É o caso de história do "Herdeiro" Errol que, a rigor, devido à sua grande dedicação, nem precisou dos rigores da lei para tornar-se herdeiro e desposar a mulher do seu falecido patrão.
Outra crônica com respingos de humor e de justiça é "O chapéu" quando, a partir do cometimento de um crime, a única prova era um chapéu de palha amarelinha, que não foi suficiente para incriminar o réu. Mas, passados os prazos de recurso, comparece o acusado ao cartório em busca do chapéu de sua propriedade. Humor existe, também, nos "fatos avulsos", como a estória do feijão que, de tão duro ao ser cozinhado, parecia com ovo cozido. Ou, na estória do menino que confunde o toque da sineta da missa com o do vendedor de picolé. E, ainda, do bolo que a mulher fez para o velório do marido, ainda vivo.
A autora incursiona também pelo caminho da tecnologia, a exemplo do relato que faz da "sonorização", tão importante em eventos de qualquer natureza, onde um simples falhar de um microfone pode colocar abaixo toda pompa de uma solenidade. Outra crônica fala de telefones, precisamente de "Telefonema a cobrar", essa parafernália moderna que ajuda e espanta, que facilita, mas atormenta.
Mas é nas histórias que envolvem o cidadão comum com os meandros do Poder Judiciário que mais aflora a verve da autora. Veja-se o relato de um pai, preocupado com o futuro dos cinco filhos em "A luz chegou com a pensão". Apela para contratos de Seguro, na certeza de que os filhos, por morte do casal, estariam devidamente amparados. Só não contara com a ganância de quatro e o desprezo para com um irmão alienado. Mas, este dá a volta por cima, casa-se e tira a pensão do controle dos irmãos.
Relatos de espera angustiante, em ante-salas, do cidadão que iria buscar a noiva no Ceará, do menino que vendia pirulito, de cenas na loucura do trânsito, de papéis velhos acumulados ao longo do tempo são expostos com emoção, culminando com a "bênção dos anéis", comovendo o quadro observado na formatura do filho, onde seu anel foi emprestado a dois colegas para bênção sacerdotal, sendo abençoado, portanto, três vezes.
Vez por outra, Onélia presenteia seus leitores com análises profundas, como faz em "Espíritos antagônicos", perscrutando o íntimo das pessoas, suas angústias, suas tiradas pessimistas ou otimistas, seus costumes. E aponta, principalmente, dois tipos de pessoas, muito comuns no nosso meio, que chateiam, machucam e são inconvenientes: as pessimistas e as antagônicas.
De igual modo o faz em "O filho e o pai", analisando a situação, nunca ignorada pelo direito, dos chamados "filhos da moita", "meios-irmãos" ou "adulterinos", situação já devidamente regulamentada por nossas leis, mas que, na prática, ainda provoca dissabores. E Onélia nos conta a bonita história de Hércules que, como médico, é obrigado a atender ao filho do pai com uma amante. E se tornam grandes amigos.
Outra crônica bastante interessante que condiz com o dia-a-dia das pessoas, principalmente nas grandes cidades, é "Diálogo quebrados". Nela, a autora analisa a caminhada matinal, com vários protótipos de caminhantes. São diálogos fragmentados, pedaços de histórias, cenas inusitadas, que a câmera invisível da cronista vai captando ao longo da caminhada no calçadão da praia. Só mesmo um cronista, com a sua perspicácia, para analisar tantos personagens dos mais diferentes matizes.
Enfim, comentar todas as crônicas do livro torna-se-ia enfadonho para o leitor que, como a autora, deve encetar "o vôo mais longo" e ir percorrendo, passo a passo, cada história, cada detalhe, rindo, emocionando-se e assimilando tudo aquilo de bom que aflora dessa verdadeira viagem orbital.
Fernando Vasconcelos.
Escritor, jornalista,
professor universitário.
Histórias Orbícolas
Onaldo Queiroga
Paginas 13,14 e 15.
quarta-feira, 20 de abril de 2011
Onélia Queiroga - Histórias Orbícolas - Apresentação
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