segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Desculpe… para onde está me levando



Palavras que curam

— Desculpe… para onde está me levando? — perguntou a mulher baixinho, olhando confusa pela janela do carro.

— Dona Marcela, chegamos. Este é o lar de idosos “Santa Ana”. A partir de hoje, a senhora vai ficar aqui.

— Ficar aqui? — a voz dela tremia. — E a minha filha? Ela não vem?

— Disse que vai telefonar, — respondeu o motorista, colocando no chão uma pequena bolsa: um casaco, uma escova, uma fotografia antiga.

— Muita saúde, dona Marcela. A senhora vai se sentir bem aqui.

O carro partiu.

Marcela ficou sozinha, com o vento frio acariciando-lhe o rosto úmido.

Na porta, uma mulher de bata azul a esperava.

— Seja bem-vinda, dona Marcela. Eu sou a Nicoleta, enfermeira aqui. Venha, vou levá-la para o seu quarto.

— Quarto? Eu tinha uma casa… um jardim… e flores…

— Aqui também vai ter flores, vai ver, — respondeu Nicoleta com doçura.

O quarto era pequeno, mas limpo. Na cama ao lado dormia uma senhora idosa.

— O nome dela é tia Ileana, — explicou Nicoleta. — Fala pouco.

— Tudo bem, — sorriu Marcela. — Eu nunca fui boa em ficar calada.

Os dias passavam devagar.

Os moradores eram silenciosos, cansados, cada um com suas lembranças.

Alguns esperavam visitas que nunca chegavam, outros viviam apenas do passado.

Mas Marcela não sabia ficar parada.

Certa manhã, pediu uma pá.

— O que vai fazer, dona Marcela? — perguntou o porteiro.

— Preciso de um pedaço de terra. Quero plantar flores.

E plantou — hortelã, manjericão, calêndulas.

— Aqui vai ser a nossa primavera, — dizia às outras. — Se não temos o que esperar, vamos esperar florescer.

Algumas semanas depois, o pátio cheirava a vida.

Um dia, tia Ileana sussurrou:

— Cheira à infância…

— Sim, minha querida. À infância e a Deus, — respondeu Marcela.

Daquele dia em diante, Ileana voltou a falar.

Marcela foi falar com a diretora:

— Deixe-nos fazer uma pequena oficina de costura e histórias. Todo mundo tem uma história. Se a gente não contar, ela morre com a gente.

A diretora sorriu.

— Está bem, dona Marcela. Se conseguir reunir o pessoal, eu arranjo os materiais.

E conseguiu.

Poucos dias depois, a sala de jantar estava cheia de vozes, risos e linhas coloridas.

— Eu fui costureira em Iași! — dizia uma.

— Eu fazia roupas para artistas! — acrescentava outra.

Marcela ria:

— Viram? Ainda estamos vivas. Temos mãos, temos coração. Só faltava vontade.

A primavera verdadeira chegou.

O lar estava diferente: flores por toda parte, paredes pintadas, rostos sorridentes.

Na porta, um poema de Marcela dizia:

“Não importa onde é a tua casa, importa ter alguém que te escute, e um pedaço de céu onde possas dizer ‘obrigado’.”

Num domingo, um carro elegante parou em frente ao portão.

Dele saiu uma mulher jovem, elegante.

— A minha mãe está aqui. Marcela Ioniță.

Marcela estava no jardim, regando as flores.

— Irina…

— Mamãe… vim te levar para casa.

— Para casa? — sorriu. — Eu já estou em casa.

— Mamãe, me perdoa… achei que estava fazendo o melhor.

— Você fez o que sabia, minha filha. Mas veja — essas pessoas não têm mais ninguém. Se eu for embora, quem vai regar as flores delas?

— Mas você não é obrigada a cuidar delas, mamãe.

— O amor não é obrigação, Irina. É presente.

Irina olhou ao redor — flores, paz, sorrisos.

— É bonito aqui, mamãe.

— É. E o mais bonito é que eu achava que a vida tinha acabado… e ela só estava começando.

Desde então, Irina vinha todos os fins de semana.

Trazia frutas, doces, roupas.

Marcela a apresentava com orgulho:

— Esta é a minha filha. Ela me ensinou que não devemos ficar magoados com quem nos deixou.

Devemos apenas mostrar que ainda sabemos ser felizes.

Com o tempo, a diretora lhe disse:

— Dona Marcela, todos aqui a amam. Queremos que seja coordenadora das atividades.

— Eu? Com setenta e três anos? — riu ela.

— Sim. A senhora é a alma deste lugar.

E assim, ela se tornou “dona Marcela” — a mulher que trazia esperança.

Escrevia poemas, preparava chá de hortelã, organizava noites de canções.

— De onde vem tanta força? — perguntou Nicoleta.

— Das lágrimas que decidi não chorar. Transformei-as em sorrisos.

Três anos depois, o lar “Santa Ana” não era mais um lugar de solidão, mas de vida.

Os jornais escreveram: “Os idosos que renasceram graças a uma mulher simples.”

Marcela recebeu uma homenagem da prefeitura.

Ao subir ao palco, disse apenas:

— Obrigada. O maior prêmio é saber que ainda temos um propósito. A felicidade não vai embora com a juventude — vai embora quando deixamos de amar.

Numa manhã, Marcela partiu serenamente, enquanto dormia.

Na mesinha de cabeceira, um bilhete:

“Não chorem.

Fui apenas regar as flores do outro lado.

Cuidem uns dos outros.

O amor nunca se aposenta.”

Irina encontrou o bilhete e chorou — não de tristeza, mas de gratidão.

Continuou o que a mãe havia começado: visitava, ajudava, trazia flores e histórias.

E assim, uma mulher simples, esquecida, tornou-se o início de uma nova vida para muitas almas.

Porque às vezes não é preciso mudar o mundo inteiro.

Basta regar uma flor.

E um coração.

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