quinta-feira, 28 de abril de 2011

Onélia Queiroga -O Menino Do Pirulito


um conto-uma crônica
Todas as manhãs, bem cedo, o menino do pirulito vestia a velha bermuda, a camisa desbotada, as desgastadas alpercatas e ganhava as ruas com a sua tábua de pirulito. O pregão imutável de "olha o pirulito!" "Olha o pirulito!"espalhava-se ao ar livre, ecoando pelos casarios das belas sinhás.

O menino caminhava ligeiro, pois precisava esvaziar os cinquentas buracos da velha tábua. O mel dos pirulitos atraía os compradores por ser amarelinho, saboroso e doce como o pregoeiro. Os dias, assim, eram iguais, com manhãs, pirulitos e pregões soando nas ruas pela voz do menino e nada mais.

Um dia, o menino saiu já cansado de tanto repetir a frase costumeira. Correu a manhã inteira e não esgotou os cinquentas pirulitos do tabuleiro. Ficou preocupado e, por isso, resolveu sentar-se no banco da praça, distraindo-se ao ver as mulheres, de leves roupas da cor de groselha, a balançar pelo vento. Ficou a pensar na sua condição e na delas. Estas eram cheirosas, garbosas e belas; ele era bem limpo e pequeno e, segundo diziam, como Éolo.

Ficou contente com a comparação que fez. Notou as passantes alegres e sorridentes; ele, ali, com igual contentamento, estava sentado tranquilo a olhá-las plenamente. Nada tinha a reclamar dos seus dias: corria livremente pelas ruas, negociava os doces, apurava o custo da feira diária, em casa comer não faltava. O que mais podia querer?

Olhou outra vez as moças e pensou: queria, queria sim, ter aquele andar firme, elegante. Deixar, ao passar, com elas, o perfume de rosas e a certeza de que recebera educação esmerada. Queria estudar; formar-se era o seu grande sonho! Ser doutor para curar os mais desvalidos. Além disso, nada mais queria, a não ser enamorar-se de uma jovem feito aquelas.

O menino sorriu, pegou do tabuleiro, pô-lo ao ombro e saiu a vender os pirulitos. Daí a pouco, voltou de bolso cheio e tábua vazia. O plano para o amanhã era vender acima de três tábuas , pois decidira, quando do banco levantou-se, que
o menino pregoeiro seria um médico verdadeiro. E foi.

Onélia Setúbal Rocha de Queiroga.
Escritora e Professora de Ciências Jurídicas
da Faculdade de Direito da UFPB.
Colunista do Caderno 2, página Cultura,
do jornal “ Correio da Paraíba”.


Histórias Orbícolas
Páginas 58, 59 e 60.

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