um conto - uma crônica
Quando Krebs compôs o Coral "Jesus, meu confidente", decerto desejou transcrever às suaves notas de seu órgão, sensações que experimentava ao se desnudar em prece de comunhão com o Mestre de Jerusalém. Não creio que possa existir momentos de maior transcendência interior, aquele em que você consiga sintonizar com a imagem de Jesus Cristo e, em harmonia com as mais elevadas vibrações de sua mensagem, mostrar-se de alma inteira, com todos os sentimentos, à sua própria consciência.
E como são necessários esses raros instantes em que conseguimos esquecer a vida exterior, escutar um pouco da eternidade que há dentro de nós. Certamente, Johann Ludiwg Krebs, esse alemão que teve o privilégio de ser aluno de Bach, sentia-se perto de Deus nas aulas de órgão, imerso no místico e solene ambiente de uma igreja gótica, em Leipzig.
Às vezes tenho a exata impressão de que já vivi naqueles anos em que se respiravam arte e erudição pelas calçadas, bosques e ruelas estreitas, onde o silêncio se enriquecia apenas com o toque dos sinos, o canto das gaivotas, e o trottoir de alguma charrete.
São momentos e cenários cada vez mais raros e distantes. O mundo se degenerou, contaminou-se com todo tipo de poluição.Ninguém cultiva nem aprecia a reflexão, o silêncio, o sossego. Não se olha mais para as flores, não se escuta o mar, nem os bem-te-vis. A convivência com a arte é escassa e pueril. Com a música, nem se fala. E os momentos de religiosidade se deturparam em cultos barulhentos, superficiais, em crenças e seitas separatistas, muito longe do ecumenismo em torno do amor, da tolerância da solidariedade que "Jesus, meu confidente" nos transmitiu há dois milênios, e que Ludiwg Krebs colocou em suas composições, há quase 300 anos. E que graças à tecnologia, essa arma poderosa capaz de unir séculos e homens, tanto quanto fomentar o progresso predador, posso ouvir agora, de minha poltrona.
Ainda bem que resta a música. A verdadeira e pura música, que molda em melodia os sonhos e a poesia da natureza, a tempestade numa sinfonia Pastoral, o brilho da noite numa "Sonata ao Luar", a comédia dantesca e a tragédia da paixão em uma bela ópera, ou num rico balé.
É nesta mesma música, que tão bem se harmoniza com o silêncio e com a solidão acompanhada, que dá pra sentir Jesus como nosso maior confidente.
Germano Romero é arquiteto e bacharel em Música.
Publicada no jornal Correio da Paraíba
Página Opinião
15/03/2013
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